08 janeiro 2010

Pela afe(c)tividade verbal

Sim, sou mãe do mundo. O mundo é parte de mim, porque de mim nascido. Ele vive por minha conta e graças aos meus olhos, mesmo quando eles se voltam pra dentro, brancos para esse universo. O sinto, o vejo, o provo. Mas, como minha cria, cria ele as suas pernas, e as minhas, pequenas, não conseguem abraçá-lo. Nem os que dele fazem parte, e o geram, e o criam também, mães por sua vez.

Embora bastante nova ainda, já dei vida a muitos amores. Alguns, com os quais esbarro por tantos caminhos, apenas filhos em potencial... nem chegam mesmo a desafiar as barreiras iniciais de toda maternidade. Outros, gestações interrompidas, pois nem todo fruto há de vingar, lei natural que há pouco aprendi.

Tive, ainda, filhos que me tiraram do peito antes mesmo de poder nutri-los e fazê-los fortes para também me alimentarem. Desses me queixo. O corpo sente a falta da alma e se endurece pela inflexibilidade do que nos força a contrariar a nossa natureza.

Mas aqueles que seguiram seu rumo, ah, por esses me faço o que sempre fui. Menina, mulher. Aceito minha condição de também casa de outros. Tenho um vazio constante que, nesse sentido, só me preenche. Recebo sempre e me doo mais. Tiro de mim o que sempre me falta, me aparto e, dividida, me multiplico naquilo que crio e acarinho.

Apesar de nunca ter gerado um único filho em meu ventre, nutro todos os dias existências alheias, que, de mim paridas, carregam parte do que sou e deixam parte do que fomos.

Por isso, é preciso cuidado. Não medo. Brincar de Deus assim todos os dias é coisa séria. Mas também banal. E não há leviandade no que falo, mas sim a mais pura aceitação dessa minha condição.

Sim, sou mãe do mundo. E assim me paro. Ou, melhor, vou me parindo...





obs.: o texto – também um filho – foi lentamente escrito desde 08 de dezembro de 2009, dia de Nossa Senhora da Conceição.