24 julho 2009

meu nome é eu

Era uma vez um menino que se chamava... se chamava... peraí! Talvez seja melhor começar a história por outro ponto. Era uma vez uma moça que vivia encantada com tudo o que via; se espantava com a força daquilo que chamava de vida, que podia ser desde o movimento de um bicho para andar – e também o seu próprio, como bicho que é –, passando por um ronronar asmático de um gato, até, por exemplo, um ronco de fome que sentia, por vezes, sem ter querido sentir.

Adorava ficar bem quietinha depois de uma agitação só para ouvir seu coração batendo um pouco mais pra cima, assim, mais pro pé da orelha. Escutava muito e com atenção qualquer história que se dispusessem a lhe contar.

Um dia, de espanto, a moça percebeu que sua barriga vinha crescendo, e o ronco tão familiar passou a ser acompanhado também por uma mexida engraçada, vinda lá do fundo de não-sei-onde como uma colherada num pote de gelatina.

Mais ou menos assim, sentindo cada dia mais não só o seu, mas o outro coração também, a moça ganhou nos braços o menino que se chamava... bem, desde o início era sua grande dificuldade: antes de chamá-lo, precisava ver por que ele atendia.

Esperou dias até que resolveu batizá-lo de Francisco, como tantos de sua terra e por sua crença no santo querido. Mas não foi só isso não! Com um nome assim, como o de tantos outros, só ele poderia se dar o nome que merecia de verdade.

Nascido, por estranho que pareça, gordinho, o menino – ou Francisco, como queiram – foi crescendo e espichando suas dobras. Parece que nascera com a fome de saber da vida e de tudo o que o homem colocou dentro dela, matéria que tanto impressionava aquela moça.

Passava tempos e tempos que não sei qual medida observando, olhando, ouvindo bem para que quase nada lhe escapasse. Diziam se alimentar de vento porque nunca o viram com um prato de comida na mão. Os outros meninos até estranhavam no início o jeito daquele menino, mas inteligência de criança é lá coisa que se dê pra prever? Logo que perceberam que ele era assim, com seu ritmo meio engraçado, de quem não se apressa pra ser, achando engraçado mesmo assim, foram deixando que Francisco assim fosse.

Também com sua grande sabedoria de criança, Francisco sentia que as brincadeiras que faziam não eram por maldade (como costumam dizer por aí que criança é bicho cruel), quando o chamavam de pé-de-chumbo no jogo de bola, ou pé-de-vento quando, sem perceberem, escapava daquilo que não queria ou não gostava – Francisco não estava mais lá.

Fugia para se-sabe-lá com uma tranqüilidade de peixe dormindo (ou acordado, até porque a gente nunca sabe quando é um e quando é outro). “Deixa ele longe... depois ele volta”, falava a moça espantada, assim como alguns outros que passaram a chamá-lo de Chico porque, me contaram uma única vez, era um jeito mais estalado, assim, menos nome e mais chamação pr'aquele que, também num estalo, ia e voltava de seus tantos outros lugares.

Mas Chico só não bastava e, justo por perceberem bem o que só ele falava e era e se ia, Francisco, por seu próprio pé-de-moleque, do jeitinho que sua mãe com toda sua surpresa tanto esperara, passou a ser conhecido como Chico pé-de-nuvem... ou aquele menino que era uma vez.

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